-OS IMPREVISTOS QUE MOTIVAM-
Quantas
vezes em nossas vidas nos deparamos com situações em que falamos: “
- Seria engraçado se não fosse trágico!!!”
Pois
é, na minha busca por sonhos não foram poucas às vezes onde me
deparei com esta frase, ou com aquela: “ - Um dia eu vou rir de
tudo isso...!”
No
Workshop Fábrica de Sonhos, faço questão de contar algumas
situações que mostram que nem todos os imprevistos são ruins.
Muitas das coisas que acontecem de forma inesperada ou ao contrário
do que esperamos, podem servir para nos levar para mais perto de
nossos objetivos. Em alguns casos, pode até recolocar-nos no caminho
correto, mudá-lo se for preciso, ou até descobrir qualidades que
sequer sabíamos que tínhamos.
Em
1997, eu tinha 20 anos. Até então, estudante de Administração de
Empresas, havia trabalhado somente na aréa administrativa e
comercial. Não vou dizer que era frustrado, mas não estava longe,
muito longe dos meus verdadeiros sonhos. Estava distante de trabalhar
com aquilo que sempre sonhei: O jornalismo. O rádio. A comunicação.
Havia
terminado um estágio em uma instituição financeira. Com êxito.
Gostava do que fazia, mas longe de estar plenamente feliz com minha
atividade. Buscava uma nova colocação. Lembro que foi em um domingo
à noite, que meu irmão mais velho, Marco, me falou que um hospital
de POA, o São Lucas, da PUCRS, estava contratando Administrativos
para o seu quadro. Meu irmão, já trabalhava na empresa há 10 anos
e naquela manhã, iria passar bem em frente ao hospital, assim, eu
iria com ele e me deixaria no local para entregar o meu currículo e
quem sabe pleitear uma destas vagas.
Recordo
que eu não estava bem. Sem conhecimento algum de inteligência
emocional, imaginava estar passando por uma fase de “azar”. Tudo
dava errado. Havia acabado o estágio e não conseguia outra
colocação. Carro estragado. Sem namorada. Havia jogado futebol e
saí lesionado. Fase danada. E quanto mais eu pensava que estava
vivendo um momento azarado, mas coisas “ruins” aconteciam. (O que
a mente produz o universo concretiza...)
Enfim,
acordei cedo. Me vesti com um traje social, peguei meu currículo e
fui. De carona com meu irmão, entramos no carro e sentimos um cheiro
muito ruim. Cheiro de “cocô” de cachorro. Convenhamos, que coisa
bem desagradável, pela manhã, logo cedo...
Meu
irmão, é claro, sentiu o odor e perguntou: “- Foi eu ou foi tu
quem pisou???” E eu totalmente desanimado respondi: “ - Não
precisa nem olhar, fui eu!!!” Ele caiu na risada e fui contatar que
realmente, quem havia pisado na merda, era eu. Saí do carro, tirei o
sapato, limpei e conseguimos deixar a Zona Sul de POA, onde
morávamos, para seguirmos com o planejado...
Como
de hábito, comprei um jornal e fui lendo até o meu destino.
Chegamos na Av. Ipiranga e logo desci rápido do veículo, uma vez
que um ônibus com motorista impaciente já começara a buzinar atrás
do meu irmão. Desci correndo para que meu irmão seguisse o seu
caminho e rumei para uma fila com mais de 100 pessoas que também
aguardavam para entregarem seus currículos. O relógio marcava algo
próximo de 6h40min da manhã daquela segunda-feira quando sentei-me
e comecei a ler o meu jornal. Passava das 11h quando me chamaram para
entrar em uma sala onde uma pessoa me recebeu. Entreguei meu
currículo e aguardei. Em 30 segundos o rapaz disse: “ - Puxa, meu
amigo! Hoje só estamos recrutando candidatos da area de
enfermagem...” Eu, incrédulo, apenas olhei resignado e falei: “
- Tudo bem. Volto quando?” Veio a resposta: “ - Candidatos da
area administrativa recebemos nas terças-feiras, mas façamos o
seguinte: Como você veio hoje, esperou e está aqui conformado que
houve apenas um erro de informação, volte amanha neste horário
mesmo, umas 11h, que lhe atenderei. Gostei de você...” Aceitei.
Fiquei feliz que no dia seguinte não necessitaria passar por tudo
aquilo de novo e fui embora em direção a parada de ônibus.
Eis
que quando coloco a mão no bolso para pegar minha carteira... Ela
não estava lá. Onde estava minha carteira??? Com todo o meu
dinheiro? Todo. Nem tanto assim. Não era muito, mas o suficiente
para duas conduções e retornar para minha casa. Pensei, pensei,
voltei ao RH do HSL, perguntei se não havia deixado lá e nada.
Sentei no meio-fio e comecei a tentar relembrar meus passos e
descobrir o paradeiro da minha carteira. Lembram quando eu disse que
havia comprado um jornal ainda no carro do meu irmão??? Pois
coloquei a carteira no painel e com a correria para descer em função
do ônibus buzinando, saí correndo e esqueci minha carteira dentro
do carro, que naquele momento estava do outro lado da cidade, na Zona
Norte da capital...
Pois
bem. Passada a irritação. Não havia nada a fazer. Ou voltava para
casa a pé, o que daria umas três, quatro horas de caminhada no
calor de fevereiro, ou sei lá o que faria. Então vi a minha frente
um jornaleiro gritando: “ - Zero, Zero, Zero!!!” (em alusão ao
Jornal Zero Hora). Olhei para baixo do meu braço, tinha um currículo
em uma pasta e uma...??? ZERO HORA!!! Pensei. Vou vender meu jornal
para o jornaleiro e volto pra casa.
Pelo
menos para bem perto, já que na época o valor de um jornal dava
para pelo menos uma condução. Não mais caminharia 3, 4 horas, mas
apenas uns 40 minutos...
Fui
até o jornaleiro. Com calma. Dei bom dia e vi uma pilha de jornais
para ainda serem vendidos. Bahhhh, me ralei, pensei....
Como
naquele momento minha única salvação seria essa e o “não” eu
já tinha, perguntei: “ - Oi companheiro! Bom dia! Cara, olha só,
fiquei sem dinheiro, deixei minha carteira no carro do meu irmão e
preciso voltar pra casa, tu não queres comprar meu jornal? Eu li só
uma vez... (com um sorriso meio sem jeito e rindo da minha
situação...)
Pausa
do rapaz. Me olhou da cabeça a baixo e respondeu: “ - Cara, eu até
te compro o jornal, mas para isso tens que me ajudar a vender esta
pilha que ainda tenho...”
Ahahahahaha...
Imaginem...
Sim.
Eu comecei a oferecer jornais para as pessoas que chegavam na
Universidade da PUC. Em menos de 30 minutos vendemos todos os
jornais. Ajudei o cara!!! Ele me disse que os jornais sempre
terminavam por volta das 15h, aquele dia não eram nem 12h e ele já
havia vendido todos, menos o meu... Que vendeu logo em seguida...
Assim,
segui meu caminho. Resolvi ir até a Zona Norte com uma só condução
e fui ao encontro do meu irmão, com quem retornei para casa mais
tarde, mas aí, já com minha carteira, pude almoçar e pelo menos,
respirar aliviado.
No
outro dia, fui até o HSL, fui contratado e comecei a trabalhar no
sistema 12/36h, o que me propiciou começar a me profissionalizar com
radialista e em 3 meses já estava trabalhando também em uma rádio
comunitária e na TV (no Canal 20 da NET/SUL – GLOBO CABO).
Em
meio aquele dia de “azar”, onde quase tudo deu errado, começava
a minha história na comunicação. Em um dia onde aprendi sobre
paciência, resiliência, solidariedade e oportunidade, iniciava a
minha caminhada. Com 21/22 anos iniciava a trilhar o caminho do meu
sonho de criança. O sonho do menino de 7, 8 anos que só queria
poder empunhar um microfone e comunicar...
Lembro
que no hospital encontrei muitas pessoas diferentes. Conheci
situações diferentes da vida. Convivia com a alegria de um
nascimento e a tristeza de uma morte em minutos, e mesmo que aquilo
na época fosse sofrido pra mim, hoje vejo que todo aquele
aprendizado me fez entender coisas que em nenhuma faculdade eu
aprenderia... Entender a vida...
Aprendi
a valorizar as pessoas. Conheci pessoas que hoje inclusive támbém
são jornalistas para que também viviam seus dramas. Pessoas que
tinham problemas muito maiores que os meus e que de certa forma,
consegui amenizar com palavras, com um olhar, um sorriso...
Trabalhando
naquele local que nada tinha a ver comigo escrevi meu primeiro livro,
o “Memórias... Crônicas... Poesias...” Conheci amigos para uma
vida inteira. Conheci entusiastas do meu trabalho que até hoje me
apoiam e seguidamente lembram desta fase tão sofrida mas não menos
importante da minha existência.
Lembro
que na função Administrativo Noturno uma das minhas atribuições
era comandar o Transporte Interno de Pacientes para Exames. De posse
de um Walk-Talkie amenizava as intermináveis madrugadas onde
vivíamos em um ambiente com pessoas que lutavam simplesmente para
viver...
Foi
um início. Um recomeço de um sonho que havia sido sepultado anos
atrás e que naquele instante ressurgia...
Uma
série de imprevistos. Um atrás do outro que me levaram ao meu
sonho. Obviamente que eu não sabia disso, mas a persistência diante
daquelas dificuldades, de cada novo empecilho, me enchiam cada vez
mais de energia e motivação de seguir no meu caminho e busca da
realização do meu sonho...